quarta-feira, 19 de março de 2014

Elefantes Brancos Fantasma

Caros leitores, venho hoje falar-vos de algumas obras públicas nacionais que foram começadas e estão inacabadas. Umas terão mais razão de existir que outras, mas, em todos os casos, mais grave do que investimentos de retorno não garantido para a economia, é estarmos a pagar algo de que não usufruímos porque as construções estão paradas, algumas a deteriorar-se e sem fim à vista. Se o anterior governo queria fazer (ou anunciar que fazia) tudo, este insiste em deixar arrastar problemas que há muito deviam ter sido resolvidos, seguem alguns exemplos:
  • Autoestrada A4 (Túnel do Marão): O túnel do Marão faz parte do troço da autoestrada número quatro que ligará, quando concluída, o Porto a Vila Real, através do maior túnel rodoviário da península Ibérica. Em 2011, o consórcio a quem a obra tinha sido atribuída interrompeu as obras por falta de financiamento, contudo, só dois anos depois é que o Estado Português resolveu o respetivo contrato, tendo alegado justa-causa por incumprimento da parte da concessionária. De acordo com o sr. primeiro-ministro, espera-se agora o retomar das obras ainda em 2014. Para trás ficam vários anos com a obra parada, perdas significativas para a economia e certamente um custo global que excederá o montante inicialmente orçado em 350 milhões de euros. É lamentável que, tendo a interrupção das obras ocorrido em junho de 2011 se tenha que esperar três anos pela retoma da mesma, mesmo não sendo imputável ao Estado a sua interrupção;
  • IP8/A26 (Sines-Beja): A ideia passa por ligar por via-rápida o porto de Sines ao aeroporto de Beja e baseia-se na assunção de que podemos importar mercadorias pelo porto de Sines para depois distribuir pela Europa por via aérea, que é algo manifestamente sem sentido. A utilização do transporte aéreo ou naval para o transporte de mercadorias a longas distâncias depende de vários fatores e, das duas umas, ou se quer rapidez, paga-se mais e utiliza-se o avião, ou, pelo contrário, não há pressa, e/ou o peso da mercadoria é demasiado para ser economicamente viável o transporte aéreo e opta-se pelo transporte marítimo.  É confrangedor ver a quantidade de viadutos que estão construídos no percurso sem que haja estrada alguma a ligá-los, que, para cúmulo, está bom de ver que são o mais caro da obra. Agora, ou deixamos os viadutos a degradar-se ainda mais como testemunhos de um tempo político, económico e moral a que não queremos regressar ou corremos o risco de ir gastar ainda mais sem racionalidade económica (venha o diabo e escolha!»);
  • Linha Férrea da Beira-Baixa (Covilhã-Guarda): A remodelação da linha ferroviária da Beira-Baixa teve lugar nos últimos anos. O último troço desta renovação e eletrificação da linha foi a troço Covilhã-Guarda. Retiraram-se os carris antigos e a obra parou. Gastou-se demasiado dinheiro para se ficar pior que antes. Se se quiser exportar a partir das zonas industriais da Covilhã, do Fundão e Castelo Branco por via ferroviária para a Europa, as mercadorias têm de fazer o percurso seguinte: Abrantes-Entroncamento-Coimbra-Guarda-Vilar Formoso. Podemos discutir se no atual contexto faz ou não sentido investir nas zonas demograficamente mais deprimidas, mas não podemos gastar dinheiro a destruir o que existe para ficarmos pior do que no princípio;
  • Variante Norte (Faro): Estamos a falar de cerca de 2.5 km de estrada que seria uma circular da cidade de Faro e que ligaria o aeroporto e ilha de Faro a Olhão e a toda a zona Este do Algarve sem necessidade de se passar por dentro da capital algarvia. Estimativas indicam que a conclusão da obra permitiria retirar diariamente mais de 20 mil veículos da cidade de Faro com óbvias vantagens do ponto de vista ambiental, económico e da segurança. A obra está parada desde 2012 por dificuldades financeiras do concessionário. É tempo de se denunciar o contrato, exigindo a respetiva indemnização ao Estado, uma célere reavaliação da virtude do investimento e a retoma dos trabalhos, se for o caso;
  • Metro Mondego (Coimbra): Este é um dos casos mais mediáticos e ilustrador do ponto a que chega a gestão pública nacional. Em Coimbra, removeram-se as linhas de comboio suburbano para construir um sistema metropolitano de superfície denominado de Metro Mondego. Criou-se uma empresa, gastaram-se milhões, e, no final, o espaço preparado para receber os novos carris é servido por autocarros. Se era para ficar pior, para que se gastou tanto dinheiro!?
Além de tudo isto, há as primeiras pedras que ficaram sozinhas – um dos casos mais paradigmático é talvez o do Hospital Central do Algarve, entre Faro e Loulé. Lá esteve o sr. "engenheiro" a coloca-la em 2009 e, até hoje, continua sozinha. Uma desconsideração para todos os portugueses. Onde estão os responsáveis pela aprovação destas obras fantasma? Quem celebrou contratos sem garantias de financiamento adequadas? Quem aprovou obras sem qualquer cabimento ou racionalidade económica? É preciso responsabilizar civil e criminalmente esta gente pelos prejuízos diretos para o erário público e indiretos para a economia nacional que causaram e continuam a causar. Não é nas urnas, através do voto, é mesmo no banco dos réus que temos de os colocar, não só para que não voltem sequer a pensar em abusar do seu poder em benefício de interesses privados ou corporativos, mas também para passar uma mensagem clara para presentes e futuros governantes e detentores de cargos públicos no sentido de moralizar o sistema e acabar de vez com o "regabofe" que dilacera as fundações do regime democrático em Portugal.

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