sexta-feira, 8 de março de 2013

Espírito Português (I)


Gostaria, antes de mais, de dizer que este é o meu primeiro texto neste blog. Apesar do dito blog ter sido criado num espírito de seriedade e bom gosto, eu confesso que irei dar sempre mais importância ao segundo. Penso que os meus textos se irão desviar um pouco do estilo e temáticas dos outros autores. Serão mais relaxados, abstractos e filosóficos. Evitarei entrar em discussões político-económicas.

Esta rubrica será a primeira de uma série com o mesmo título. Não me vou comprometer com prazos nem com um número de textos porque, sinceramente, seria muito provável que não cumprisse as metas estipuladas. Os textos terão como tema várias facetas de algo a que chamei Espírito Português, algo que é composto por um conjunto de características, boas e más, que, a meu ver, a maioria dos portugueses possui e acabam, de alguma forma, por nos definir. Para começar, decidi explorar uma característica positiva de que me orgulho muito. O tema deste texto é então a simpatia, solidariedade e amabilidade do povo português.

Durante os meus anos de vida (eu sei, não são assim muitos) e viagens por vários países da Europa, nunca encontrei gente tão simpática, afável e solidária como os portugueses. Não que me sentisse mal tratado ou incomodado nos outros países (bem, os alemães são mesmo antipáticos!). No entanto, faltava algo… senti que faltava o calor e a alegria das pessoas que são simpáticas por gosto, porque isso é algo que lhes dá prazer, e não porque é isso que se espera delas ou porque faz parte do trabalho que desempenham na sociedade.

Vou vos dar apenas dois exemplos da manifestação desta faceta do Espírito Português.

Primeiro exemplo. Há alguns anos atrás, fui acampar com uns amigos a Belver, uma bonita aldeia na margem direita do rio Tejo, a 5 quilómetros de Portalegre. Estávamos em Fevereiro e, quando saímos do comboio, chovia copiosamente. A estação fica junto à margem do rio e a aldeia no cimo de um monte vizinho. Nada havia a fazer senão subir até à aldeia a pé e com os carregos às costas sob a impiedosa chuva.

A dois terços do caminho, uma velhotinha típica portuguesa vem à janela da sua casa à beira da estrada e diz: “Ai filhos! Vocês estão ensopados. Entrem e abriguem-se da chuva.” Agradecidos, apressamo-nos a entrar, molhando o chão todo à pobre senhora. Quando demos por ela, já a senhora andava a arranjar pão e chouriças para um grupo de rapazes que nunca tinha visto. Não nos conhecia de lado nenhum, não sabia de onde vínhamos ou ao que íamos e, mesmo assim, convidou-nos a entrar na sua casa e tratou-nos como filhos ou netos que tinham chegado para lanchar.

Segundo exemplo. Ainda no outro dia, estava a ver a série de ficção histórica de produção nacional intitulada “Depois do Adeus”. Retrata Lisboa em 1975, uma altura conturbada após a revolução de 25 de Abril. A série centra-se nos fortúnios e infortúnios de uma família de retornados de Angola. São estrangeiros no seu próprio país e tudo o que juntaram ao longo de uma vida, incluindo as próprias poupanças, ficaram em Angola.

Neste episódio em particular, o filho mais novo faz anos mas sente que não há razões para celebrar. Os pais, querendo animar o filho, organizam uma festa surpresa. Como pouco conseguiram juntar desde que voltaram, pedem ajuda aos amigos e familiares. A senhora do café faz o bolo de anos e disponibiliza a sala do café, um colega de trabalho do pai dá uma bicicleta usada que o pai repara, um outro amigo dá bilhetes para a Feira Popular para toda família, a vizinha faz umas sandes,… No final, o rapaz tem uma festa de anos melhor do que poderia sonhar.

Ao ver isto, eu penso: “Isto é mesmo à portuguesa! Todos dão o pouco que podem com uma enorme boa vontade e sem segundas intenções. E o resultado é maior, mais bonito e com mais significado do que qualquer um esperaria.” Eu sei que é um exemplo fictício, mas tenho a certeza que a maior parte de nós já teve uma experiência semelhante.

Esta faceta do que eu apelidei de Espírito Português: esta simpatia, bondade, boa vontade e especialmente amizade não só para com os nossos, mas também para com completos estranhos; e esta capacidade de nos juntarmos, de bom grado darmos, todos um pouco e conseguirmos criar algo impressionante que por vezes nos espanta até a nós. Tudo isto é algo que me dá um orgulho enorme de ser Português, um orgulho difícil de expressar por palavras.

Até à próxima,
TM

PS: o link para o episódio que referi: http://www.rtp.pt/programa/tv/p28774/e7 

2 comentários:

  1. Quando o GT publicou o seu texto "Mostrar Portugal lá fora", eu já tinha escrito este texto. Por um feliz acaso, acho que esta rubrica se liga bastante bem à temática do segundo vídeo.

    E peço desculpa por ter ficado tão grande. Para a próxima tentarei ser mais conciso.

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  2. É como diz a letra do famoso fado «Casa Portuguesa»: «A alegria da pobreza, está nesta grande riqueza de dar e ficar contente!».
    Isto é ser Português. ;)

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